Campanhas de valorização do parto normal, consequências físicas da cesariana e vontade de voltar às origens são alguns dos motivos que levam mulheres do século 21 a querer dar a luz em casa, sem anestesia e com ajuda de parteiras. O último levantamento do Ministério da Saúde sobre o assunto, realizado em 2007, indica que naquele ano foram realizados 35,7 mil partos domiciliares no país – uma queda de 20% em relação a 2003. Para que ocorra tudo bem nesse tipo de procedimento são necessários cuidados milimétricos do médico ou do enfermeiro obstetra, que são os únicos habilitados a fazê-lo. Caso contrário, diante da ausência de uma estrutura hospitalar para socorro imediato, a gestante e o bebê correm sérios riscos de saúde e de vida. Um estudo realizado nos Estados Unidos e publicado neste mês no American Journal of Obstetrics & Gynecology associou os partos domiciliares ao triplo da taxa de mortalidade neonatal comparado aos partos realizados em hospitais. Nos partos realizados em casa havia uma proporção maior de mortes atribuídas à insuficiência respiratória e falhas na ressuscitação. Diante disso, especialistas falam sobre as vantagens e desvantagens do parto domiciliar. A maioria dos médicos é contra, enquanto enfermeiros obstetras o indicam como opção natural. Para a ginecologista e obstetra Lucila Nagata, membro da comissão de Mortalidade Materna da Febrasgo (Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia), entidade que é contra o procedimento, dar a luz em casa nos dias de hoje soa como um “retrocesso”. “O parto normal é uma caixinha de surpresa. Há o risco de hemorragia, de sofrimento fetal, é arriscado. E quando isso acontece deve haver a retirada do bebê o mais rápido possível. Não daria para fazer isso em casa.” Já a enfermeira obstétrica Silvéria Santos, professora da Faculdade de Enfermagem da Universidade de Brasília, que fez vários partos em casa, afirma que não há riscos desde que a mãe e o bebê estejam saudáveis. Ou seja, se a gravidez for considerada de baixo risco. “Se a gestante não tem doenças anteriores ou que foram adquiridas na gravidez, como diabetes e hipertensão, e se a placenta e o feto estão em condições normais, os riscos são muito pequenos.” Caso contrário, o parto em casa não é indicado e o enfermeiro não deve aceitar fazê-lo, explica a enfermeira. Filho em casa – Dados do governo indicam que a maior parte dos partos domiciliares continua sendo realizada nos Estados do Norte e do Nordeste, que representam 88% dos procedimentos do tipo realizados no país – nessas regiões o acesso a hospitais costuma ser remoto, dependendo da localidade. Dos 35,7 mil partos realizados em casa em 2007, 18,5 mil foram no Norte e 12,9 no Nordeste. A lista segue com Sudeste (2.500), Centro-Oeste (916) e Sul (830). Entretanto, a escolha de querer dar a luz em casa vem ganhando espaço nos grandes centros desde que o termo “parto humanizado”, como o realizado de cócoras na banheira por Gisele Bündchen, se tornou sinônimo de saúde e passou a ser adotado por celebridades. Vale salientar, entretanto, que a humanização do parto significa o quanto a gestante participa do processo, não o local onde ele acontece, explica Lucila Nagata, da Febrasgo. Portanto, atitudes como escolher o local, a posição que quer parir e pedir pela presença do pai do bebê já tornam o parto humanizado. Esses aspectos, somados à falta de programação, de medicamentos e intervenções cirúrgicas, seduzem as mulheres pelo seu aspecto natural. A presidente da Abenfo-SP (Associação Brasileira de Obstetrizes e Enfermeiros Obstetras de São Paulo), Karina Fernandes Trevisan, explica que a mulher que procura pelo parto domiciliar quer um parto no qual ela possa seguir seus instintos, sem ter de ficar presa ao protocolo hospitalar. “Estava com uma gestante com dilatação total que quis tomar sorvete para se aliviar, pois estava em casa. Isso jamais aconteceria no hospital.” Vantagens e riscos do parto domiciliar – A realização do parto normal por enfermeiros obstetras está prevista na lei 7498/1986, conforme a legislação do exercício profissional da enfermagem. Para tanto, o enfermeiro se especializa em obstetrícia na pós-graduação, durante dois anos, explica a enfermeira obstetra Andrea Porto, conselheira do Coren-SP (Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo). Capacitado para fazer apenas partos normais, o enfermeiro deve acionar um médico obstetra ao menor indício de problema durante o trabalho de parto e, enquanto ele não chega, ser capaz de conter sangramentos. “Cabe à enfermeira somente realizar o parto normal que não apresente problema nenhum. Mas se tiver qualquer problema durante o trabalho ou no parto, essa responsabilidade tem que ser dividida com o médico.” Além disso, o paciente deve avisar ao enfermeiro obstetra durante o pré-natal sobre que hospital deve atendê-la em caso de problemas. O correto é sempre levar ao estabelecimento mais próximo da residência da paciente. Outro ponto importante para o bom andamento do parto em casa é o enfermeiro ou médico ter em mãos bons equipamentos capazes de conter sangramentos e suprir oxigênio. Vale também estar acompanhado de um neonatologista, que saberá avaliar a condição de saúde do recém-nascido. São estes os cuidados da ginecologista e obstetra Betina Bittar, especialista em parto natural hospitalar e domiciliar. “Vamos com vários equipamentos, com acompanhamento de um neonatologista pediatra, que está apto a fazer todas as manobras em caso de ressuscitação, além de equipamentos de oxigênio e algumas medicações. Se ela tiver sangramento, temos soro, medicações para parar o sangramento.” Betina explica que, em certos casos, reserva uma ambulância na porta da casa da paciente, caso precise levá-la ao hospital. Para o ginecologista obstetra Eduardo Cordioli, do hospital Albert Einstein, mesmo diante desses cuidados, não vale a pena o risco. “Sou totalmente contra parto em casa, assim como a Febrasgo é. Fazer o parto em caso é a mesma coisa que escalar uma montanha sem corda de segurança, você até pode chegar no topo, mas uma escorregadinha acaba com sua vida.” O médico afirma não haver evidência científica que comprove que dar a luz em casa seja melhor do que no hospital. (Fonte: R7 – 28/07/2010)
Fazer o parto em casa implica conforto e riscos. Veja as vantagens e desvantagens
28/07/2010 | 03:00