A Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), a Sociedade Brasileira de Cirurgia Cardiovascular (SBCCV) e a Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista (SBHCI) resolveram unir esforços para conseguir que o Brasil passe oferecer a oportunidade de cirurgia a cerca de 16 mil crianças que nascem com problemas no coração e que morrem a cada ano, na fila de espera por uma cirurgia que as salvaria, mas que não é realizada por falta de recursos.

O problema, explica o presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia, Jadelson Andrade, é que a cada ano nascem cerca de 24 mil crianças com cardiopatias congênitas, algumas das quais podem ser detectadas ainda no útero, mas o País não conta com a infraestrutura necessária, nem com suficiente mão de obra capacitada em diversos estados para esse tipo de cirurgia. O problema é tão grave que ele já teve oportunidade de abordar recentemente o assunto com a presidenta Dilma Roussef que se mostrou extremamente sensibilizada.

“Há muita diferença entre operar o coração de um adulto e de uma criança, que é uma cirurgia de alta complexidade”, explica o cirurgião Fábio Jatene, e há necessidade de financiar hospitais e serviços para que passem a ter os equipamentos necessários, inclusive nas UTIs. É necessário capacitar e treinar um maior número de cirurgiões nesta área, bem como cardiologistas pediátricos intensivistas, preparar adequadamente suporte de enfermagem, fisioterapia e fazer um planejamento para que haja uma distribuição territorial adequada dos centros especializados ao atendimento onde as crianças possam ser operadas, flexibilizando as regras para credenciamento dos serviços. “Sem esses cuidados, o Brasil continuará operando entre sete e oito mil crianças por ano”, diz o presidente da Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista, Marcelo Queiroga, e deixando de atender a outras 16 mil.

O consenso sobre a necessidade de um planejamento para evitar essas mortes levou o presidente da SBC a convocar na semana passada, em São Paulo, uma reunião com o presidente da SBCCV, Walter Gomes, com o presidente da SBHCI, Marcelo Queiroga, presentes também os representantes da área científica das entidades Fabio Jatene, Pedro Lemos e  Luiz Alberto Mattos.

No encontro ficou decidido que as três sociedades, que reúnem mais de 13 mil cardiologistas, farão um trabalho conjunto. Vão levantar a exata demanda de cirurgias cardíacas pediátricas por região territorial, os centros já capacitados e definirão os serviços e hospitais que podem ser adaptados para esse tipo de intervenção. Vão analisar qual o custo para essa capacitação, para que esse projeto com valores definidos seja levado ao Ministério da Saúde em nome das três sociedades, objetivando a solução do problema.

“Esta é a primeira vez que as três entidades lideradas pela SBC unem esforços para equacionar um problema que se agrava”, diz Walter Gomes, da SBCCV. Ele tem certeza de que a questão será resolvida, pois lembra que “se isoladamente cada sociedade médica tem imensa credibilidade perante a população e o governo, unidas terão muito mais condições de exigirem a solução. Essa união é necessária também para que cada criança cardiopata seja avaliada conjuntamente por um cardiologista pediátrico, por um cirurgião e pelo hemodinamicista, de forma a garantir a melhor opção de tratamento para cada caso.

O financiamento da infraestrutura terá que ser feito pelo governo, dizem os especialistas, pois há necessidade da criação em todas as regiões do país de centros de referencia especializados em atendimento a crianças portadoras de cardiopatias congênitas e colocar em operação plena aqueles já existentes. As sociedades assumirão a responsabilidade de levantar a realidade do País neste aspecto e elaborar um projeto que viabilize rapidamente o início do atendimento e, desta forma, tentar reduzir este cruel perfil epidemiológico atual.

 Segunda causa de morte – Para Walter Gomes, a situação é complexa “e difere nos vários Brasís que coexistem”, pois em São Paulo, onde não há mais mortes por desnutrição e se reduziu drasticamente a mortalidade infantil por doenças infecciosas e por desidratação, as cardiopatias congênitas já são a segunda causa de morte em crianças até 16 anos, mas mesmo neste Estado não tem sido possível operar todas que necessitam de cirurgia.

O especialista diz que no Norte e Nordeste a carência é maior, falta acesso ao tratamento, hierarquização e também o treinamento, “é preciso capacitação especial para que o cirurgião seja capaz de operar uma criança que já nasceu com baixo peso e cujos órgãos são minúsculos”.

“O Brasil tem que buscar solução própria”, diz Marcelo Queiroga, “porque em países como a Inglaterra e a França, por exemplo, não há tanta cardiopatia congênita, devido à institucionalização do aborto”. O médico explica que muitas mulheres europeias preferem abortar um feto que sabem nascerá com uma cardiopatia e tentar ter uma criança saudável em outra gravidez. “É uma solução cruel, que não existe no Brasil”, diz.

“Mesmo quando há centros de excelência e salas cirúrgicas adequadas, faltam recursos”, diz Jadelson, que dá o exemplo de um  hospital paulista que opera pelo SUS e no dia 10 de cada mês esgota a quota de atendimento, o que deixa crianças na fila, muitas condenadas à morte.  Ele afirma que esta situação é inaceitável e não pode perdurar também porque, garante, “hoje grande parte dessas cardiopatias congênitas tem alto potencial cirúrgico de cura e a cardiologia brasileira pela posição que tem hoje no país e no mundo não pode ficar a margem deste processo e não ficará”, assegura.

 Fonte: SBC

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