A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) está cometendo falhas no processo de avaliação e divulgação da qualidade dos serviços oferecidos pelas operadoras de planos de saúde e dos médicos que atendem na saúde suplementar. Este é o entendimento do pleno nacional dos Conselhos de Medicina ocorrido em Pernambuco em 2011. O alerta é atual e reforçado com a entrada em vigor de regra que obriga as operadoras de planos de saúde a divulgarem em seus manuais os atributos de qualificação de seus prestadores de serviço (médicos, hospitais e laboratórios). Os problemas que podem induzir os consumidores e pacientes a uma escolha equivocada de plano de saúde têm origem em um dos indicadores criados pela ANS e que passa a vigorar partir de março de 2014.

     O Programa de Divulgação da Qualificação de Prestadores de Serviços na Saúde Suplementar (Qualiss), instituído pela RN nº 267 em agosto de 2011, coloca ênfase na avaliação de aspectos de infraestrutura das unidades e de formação dos médicos credenciados. O Qualiss determina às operadoras darem visibilidade à determinadas características de cada médico pela agregação de diferentes “selos” ao seu nome nos manuais. As ilustrações destacarão a posse de especializações, conclusão de programas de residência, entre outros. Na internet, era previsto que, desde setembro, esses “atributos” já estivessem visíveis nos sites das operadoras com mais de 100 mil usuários.

     Para as entidades, esta abordagem cria distorções e causa confusão e constrangimentos. “Isso apenas discriminará parte dos prestadores, o que em nada contribui para a melhoria da assistência médica suplementar”, já alertavam em documento aprovado no pleno nacional de setembro de 2011. O documento, que pedia a anulação imediata da RN nº 267, levou as entidades a questionarem na Justiça a decisão da Agência. Dois anos depois, a insatisfação da categoria permanece. A norma que instituiu o Programa de Qualificação foi atualizada este ano pela RN nº 321, assinada pelo presidente da ANS, André Longo.

    “Incentivamos o aperfeiçoamento profissional, por meio da obtenção de títulos, boa formação acadêmica e educação continuada dos médicos. Mas a qualificação do profissional vai muito além. Ela envolve fatores como o exercício ético, a experiência e a habilidade técnica. Essa percepção também envolve aspectos externos e a autonomia plena sobre o ato médico”, disse o 2º vice-presidente do CFM, Aloísio Tibiriçá Miranda, que também coordena a Comissão Nacional de Saúde Suplementar.

    Falta de equidade – Além dos problemas do Qualiss, Tibiriçá reclama da falta de isonomia na forma de divulgação em relação ao Índice de Desempenho da Saúde Suplementar (IDSS), outro instrumento criado pela ANS para nortear os consumidores na hora de contratar um plano de saúde. “Para escolher seu médico o paciente terá a mão um selo de ‘qualificação’ de acesso imediato no livro dos convênios. Já para saber se um plano é bem ou mal avaliado o consumidor terá que superar uma corrida de pelo menos sete obstáculos no site da ANS”, ressaltou.

    Criado em 2006, o IDSS avalia, anualmente, o desempenho das operadoras com registro ativo. Ele leva em conta itens relacionados à produtividade na assistência, à situação econômico-financeira da empresa, à infraestrutura e o nível de satisfação dos beneficiários. No entanto, uma mudança na forma de colher a opinião dos clientes, introduzida este ano, mascarou a realidade do setor, contrariando as estatísticas dos diferentes órgãos de defesa do consumidor.

   Inquérito – Até ano passado, o grau de satisfação do consumidor era baseado na análise do número de reclamações e em fatores como permanência, desistência e processos. Em 2013, as operadoras foram orientadas pela ANS a promoverem um inquérito telefônico onde perguntam aos seus clientes se estão contentes ou não com os serviços oferecidos.

    Como resultado desse novo método, apareceu a distorção: 72% dos entrevistados se declararam satisfeitos ou muito satisfeitos com seu plano de saúde. O percentual conflita com outros dados que confirmam a liderança do setor no ranking anual de reclamações. Recente enquete realizada pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), por exemplo, mostra que somente 9% dos consumidores de planos de saúde estão completamente satisfeitos.

    Método falho – Para a Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste), esse método também é falho. Entre outros pontos porque há conflito interesse, pois as mesmas empresas que serão avaliadas ficarão responsáveis pela aplicação no inquérito. “O consumidor pode ficar constrangido em dar sua opinião sabendo que é a empresa quem está compilando as respostas e pode temer retaliações caso precise usar os serviços contratados”, apontou a Proteste.

    O índice final ficou ainda mais comprometido porque a participação das empresas foi voluntária e a amostragem dos entrevistados não era representativa. De 419 operadoras de médio ou grande porte apenas 89 colaboraram com o processo, o que, para a Proteste, pode significar que operadoras que esperavam avaliações negativas ficaram de fora.

     Outra crítica atribuída ao IDSS é o peso atribuído à satisfação dos beneficiários, hoje limitado a 20% do total do Índice. “Embora seja importante conhecer a dimensão econômica das empresas e sua estrutura de atendimento, a opinião dos consumidores deve ter um peso maior na avaliação final das operadoras”, ponderou Aloísio Tibiriçá.

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