Gabriela Costa, 32 anos, tem muitos sonhos. Um deles é ser mãe. Ela viajou de Brasília para se consultar no Centro de Estudos do Genoma Humano da Universidade de São Paulo (USP) porque tem uma doença genética degenerativa – distrofia muscular do tipo cinturas – e precisa estar segura para tomar a decisão de ter um bebê. “Preciso fechar meu diagnóstico e saber dos riscos de transmissão da mutação genética. E se ficarei bem na gestação, porque já sinto algumas limitações respiratórias.” A doença de Gabriela leva à deficiência de proteínas musculares e se manifestou pela primeira vez há seis anos. Em 2004, ela passou a usar cadeira de rodas. Gabriela, que trabalha na Secretaria Nacional de Juventude, deseja formar uma família. Ela acredita na promessa que as células-tronco representam. Especialmente as embrionárias, a grande esperança da medicina do novo século. “A expectativa ajuda. Para quem não tinha nada, uma possibilidade é muita coisa.” Já se pesquisa células-tronco adultas há cerca de 30 anos. Os resultados são apontados como promissores. Elas podem ser extraídas da medula óssea, do cordão umbilical, polpa de dentes, placenta, fígado e sangue. Os estudos, porém, indicam que as células adultas têm capacidade de formar apenas alguns tecidos e que não servem para pessoas com doenças genéticas, já que os genes defeituosos estão em todas as células do corpo. Em resumo, elas não têm a versatilidade das embrionárias. Estas, sim, são capazes de formar um ser humano completo. Cada uma das oito células que formam o embrião de cinco dias – que representa um minúsculo ponto dentro de um buraco de agulha – detêm o poder de restituir neurônios, músculos e ossos. E de refazer conexões nervosas e restaurar mobilidade. No entanto, a possibilidade de pesquisar as células extraídas de embriões humanos é algo imperdoável para muitos. Considera-se que não seria digno nem ético “atacar” o embrião fisicamente para uma pesquisa. Por isso, a lei brasileira que permite e regulamenta as pesquisas com células-tronco embrionárias, aprovada em março de 2005 pelo Congresso Nacional, foi contestada pela Procuradoria-Geral da República. A lei permite o uso de embriões descartados ou congelados há mais de três anos nas clínicas de fertilização assistida e com autorização expressa dos genitores. E apenas com os embriões já congelados no momento da aprovação da lei, o que limita o número dos que poderão ser usados, mas também elimina a possibilidade de comércio e produção apenas com essa finalidade. Segundo a ação, que pode ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal a qualquer momento, a lei fere o direito constitucional à vida e deve ser proibida no Brasil. O tema polêmico fez com que o ministro Carlos Ayres Britto, relator da ação, convocasse a primeira audiência pública da história do Tribunal. “Estamos com um dilema de dificil resolução, porque nossa opção é entre o certo e o certo. Vamos ouvir os especialistas”, afirmou Ayres Britto em audiência no dia 20 de abril que reuniu 26 cientistas – a favor e contra as pesquisas. A jornalista Andréa Bezerra de Albuquerque, de 33 anos, tem distrofia muscular assim como Gabriela e fundou, em 2003, a organização não-governamental Movitae – Movimento em prol da vida -, para apoiar as pesquisas. Ela afirma que seu apoio é total, mas jamais será incondicional. A ONG lutou pela aprovação da lei no Congresso e foi aceita como amicus curiae (amiga da Corte) no julgamento do Supremo. “Queremos as pesquisas de modo ético. Um número incontável de pessoas precisa delas. A expectativa frente a esses estudos é imensa e o risco de frustração ou de se submeter a falsos tratamentos ainda é grande.” Para que isso não ocorra, pesquisadores brasileiros criaram o Instituto Virtual de Células-Tronco (www.ivct.org). O objetivo é contribuir com os estudos e promover o debate entre cientistas e a sociedade civil. O neurocientista brasileiro Stevens Rehen, que estuda as células-tronco desde 1996, é um dos idealizadores. Ele começou pesquisando células neurais progenitoras. Em 2003, teve as primeiras experiências com as embrionárias em seu pós-doutorado, na Universidade da Califórnia. Agora, desenvolve pesquisa básica na Universidade Federal do Rio de Janeiro para compreender as células embrionárias e conseguir que se transformem em neurônios específicos. “Uma pessoa com doença de Parkinson, por exemplo, precisa de um neurônio que produza dopamina. Existem mais de 10 mil outros tipos. As células-tronco não vão curar todas as doenças, mas criaram uma sede de aprender. Por meio delas entenderemos as fases iniciais da formação humana e das doenças.” O desejo de contribuir com os estudos fez a vereadora Mara Gabrilli, 39 anos, tetraplégica há treze, oferecer-se como cobaia de pesquisas com célula-tronco adultas no Instituto de Ortopedia e Traumatologia da USP. “O que descobrissem seria bom para todos. Minha propriocepção (capacidade sensorial em perceber os movimentos e o espaço que o corpo ocupa) melhorou. Percebo quando estou mal acomodada e isso é uma grande conquista.” O coordenador das pesquisas, Tarcísio Barros, afirma que 60% dos 30 pacientes com lesão medular por contusão estudados tiveram retorno da passagem da condução elétrica do cérebro para o corpo. Por isso, conseguiu aprovar novo protocolo de pesquisa, ampliando o grupo para 40, e busca recursos para iniciá-la. “Sou favorável também às pesquisas com célula-tronco embrionária. Elas abrem perspectivas de terapias para inúmeras doenças consideradas incuráveis até o momento”, diz. Fonte: Uol Ciência e Saúde
Células-tronco são esperança de revolução nos tratamentos de doenças e deficiências
18/09/2007 | 03:00